sábado, 10 de abril de 2010

Voltaremos à língua do “goo goo daa daa”?


É exatamente isso que está acontecendo. Eu arriscaria dizer há uns vinte anos, aproximadamente. É que a coisa vem num crescente exponencial e já está beirando às raias do ridículo em alguns casos.
Por que diabos a linguagem no mundo dos negócios se transformou num caso patológico? O que me parece mais interessante nisso tudo, é que recém-formados, sem que se dêem conta, estão usando e abusando de expressões em inglês, repetidas a esmo, como o fazem os papagaios. Eu tenho uma teoria. Não sei se é interessante ou apenas mais um pensamento meu que não vai auxiliar (não deveria ser agregar valor?) em nada.
A minha teoria é a de que os professores universitários lêem verdadeiras avalanches de "teorias" financeiras, administrativas, de marketing etc, que vêm proliferando mundo afora, notadamente nos EUA, país onde até recadinho para o colega se transforma em material a ser vendido, basta ter um bom marketing por trás, é claro.
A minha teoria é que, atualmente, qualquer pessoa escreve um livro. Basta ser graduado em alguma destas áreas, e pronto. O próximo passo é encontrar um "ghost writer" e qualquer pessoa está apta a encher lingüiça, ou seja, falar muito sem dizer rigorosamente nada. Então, vem a fase de fazer uma capa atraente com um título instigante, de preferência com pelo menos uma palavra rebuscada, e achar uma editora que queira publicar e distribuir mais um "best seller" da família das Cucurbitaceae (abóboras para os íntimos).
Sinceramente, acho que, hoje, qualquer pessoa mais "espertinha", se é que me faço entender, “cria uma teoria prodigiosa” e ainda encontra um bando de gente que vai comprar o livro, aplaudir o autor e sair repetindo todos os jargões que ele criou no seu mais novo best seller, mesmo sem ter entendido bulhufas do que significa a tal "teoria". E assim, uns seis meses depois, esse mesmo “autor” escreve outro livro, com outras tantas palavras que, se ainda não são jargões na área, se transformarão rapidamente. Afinal, o “autor” já escreveu um livro anteriormente e saiu-se muito bem com suas expressões. E depois desse embuste todo, ele já não é mais apenas um economista, um administrador etc... Não. Ele é agora um escritor! E todos repetem suas palavras como um papagaio. E eu posso jurar que ninguém, jamais, questionará nenhuma "teoria" desses "autores". Será que vocês conseguem me entender?
E assim acabamos de lançar mais um “guru” no mundo editorial. Tão simples quanto isso.
Eu estive conversando com um grande amigo sobre isso. Sempre que eu escrevo alguma coisa, seja no meu blog, seja em algum fórum, ou qualquer lugar na grande rede, muitas pessoas me mandam e-mails dizendo que gostaram muito do que eu escrevi e tecendo elogios além do normal. Eu fico deveras surpresa. Porque, na maioria das vezes, eu apenas descrevi uma indignação minha a respeito de algo, nada mais. E as pessoas gostam porque não estão acostumadas a questionar, a analisar os fatos. Nós chegamos a esta conclusão, pois eu havia dito que estava quase pegando alguns fins de semana para "escrever um livro" sobre uma teoria que eu ainda iria criar. Imaginem, com um bom coquetel de lançamento, quiçá em São Paulo, nos Jardins, bastaria que algumas pessoas como nós (que também somos formadores de opinião, mesmo sem perceber), fizéssemos alguns elogios... Aí, uma notinha plantada numa coluna social e... Voilà. Tem-se um best seller de 300 páginas com facilidade. Só que o título teria de ser algo como "A Teoria das Cucurbitaceae", infelizmente.
Prezados, definitivamente, as pessoas perderam o senso crítico. Estamos diante de papagaios que repetem o que o líder do bando disser. Será que ninguém percebe que isso tudo é um monte de jargões rotos, palavras vazias que não fazem o menor sentido??? O ponto é que esse tipo de coisa me deixa pra lá de indignada. E pior, com um sentimento de impotência tamanho família.
Não agüento mais os “gerentes hands on”, os “projetos as built”, “think out of the box” (essa é de matar), temos ainda as expressões em português que não significam exatamente nada, mas que precisam ser escritas nos seus e-mails sob pena de vocês serem confundidos com seres alienígenas.
A Revista Exame publicou há um tempinho um comentário interessantíssimo do Max Gehringer. O artigo dizia o seguinte: Leia com atenção o diálogo a seguir: “Precisamos adotar as melhores práticas. Mas com foco no cliente? É claro! Sem isso, perderíamos nossa vantagem competitiva, afetando o bottomline no longo prazo. Mas, se não nos alinharmos aos stakeholders, vamos deixar de estar agregando valor ao negócio.”
Agora, voltando ao âmago da minha teoria, leiam, por favor, este micro glossário do todo poderoso, Jargão.
1. Alinhar: “Sua estrutura de TI precisa estar alinhada com o plano de negócios”.
2. Aderente: Esta pode ser perfeitamente utilizada na frase anterior, pois não muda em nada o seu sentido e também faz parte do mesmo rol. “Sua estrutura de TI precisa estar aderente com o plano de negócios”.
3. Holístico: “O processo holístico de gerenciamento visa a integrar as múltiplas funções da organização”. Esse seria traduzido por algo como “Não conseguiu identificar a origem dos problemas da empresa? Tente um approach holístico”.
4. Agregar Valor: “Se queremos que paguem mais por nossos produtos, precisamos agregar valor."
5. Soluções: “A estratégia da empresa é oferecer soluções fim-a-fim com mais destaque no mercado." Ou seja, não se vendem mais produtos e serviços, isso é coisa do passado, agora, disponibilizam-se soluções.
Isso tudo sem contar a grande sopa de letrinhas que são as trocentas siglas (todas em inglês, é claro) que são ditas ad nauseam para demonstrar conhecimento do negócio e bastante poder. Lá vão algumas. CPM, RGP, ERP, PMP, ITIL, BSC, Análise SWOT, e os famosos CPO, CFO, CIO, CEO, CTO, CSO, CCO, CKO etc etc etc. Tudo bem americanizado.
E as pérolas que são os verbos mais utilizados no mundo das grandes corporações? Coisas como os verbos upgradear, deliverar, performar. Tentem conjugá-los em pelo menos um tempo de um modo qualquer que seja. Parece uma piada? Mas é triste, é lamentável, pois os empregados... Ooppss... Não, não, isso é politicamente incorreto. Eu ia dizendo, os colaboradores das grandes empresas nunca foram tão evasivos em suas falas. E isso já nos custou um adeus à língua portuguesa (escrita e falada) há, pelo menos, duas décadas.
Para terminar, gostaria de perguntar a vocês. Vocês se subscreveriam assim? Conrado Morlan MBA PgMP® PMP® IPMA Level C®
Quero ressaltar que não conheço este senhor, apenas sei que ele é um diretor de TI em Dallas, nos EUA. Já dizia René Descartes, nas primeiras páginas do seu Discurso do Método, que bom senso é aquilo que todos acham que têm na quantidade suficiente.


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