segunda-feira, 30 de maio de 2011

In Vino Veritas Est

Significado: In Vino Veritas Est = No vinho está a verdade.
Ora! Os gregos quando queriam descobrir táticas de guerras ou outros segredos, faziam banquetes e convidavam alguns conspiradores de guerras amigos ou até mesmo inimigos. Onde davam vinho para todos eles, lá eles se embriagavam e com o efeito do álcool existente no vinho, até então desconhecidos, os deixavam relaxados e falavam todo o qual sabiam.



Este domingo comentei no Facebook uma matéria postada por um amigo, publicada na Folha de São Paulo. Dizia o título “Preço e rótulo do vinho podem enganar sommeliers, dizem estudos”.
Esses “estudos” me deixam para morrer de raiva, pois em sua maioria esmagadora, nada mais são do que engodo para que os tais “especialistas” justifiquem seus salários ou venda de livros, palestras etc. Deve ser triste ter de trabalhar assim para sobreviver, sem fazer nada de útil a ninguém. Entretanto, na selva em que vivemos, sobrevive o que melhor se adapta. Fazer o quê?
Na matéria da Folha, o articulista Hélio Schwartsman, começa dizendo que a crítica de vinhos não é muito mais do que uma fraude. Até aqui não discordo. A crítica de vinhos e algo tão abstrato e subjetivo quanto a crítica literária, teatral etc. Quem faz parte desta tal “crítica”? Quem são os “críticos de vinhos”? Quem, ou o que, lhes confere esse poder?


O lendário Petrus, o vinho que todo Merlot gostaria de ser

Origem da palavra sommelier
Durante o Renascimento francês, quem se predispunha, comprava o título de “sommelier” para então fazer parte da comitiva do rei ou de um nobre. Durante as viagens, o sommelier era responsável pela armazenagem dos alimentos e dos vinhos e mantinha essas provisões numa carruagem chamada “somme”. Contudo, a tarefa mais importante do sommelier era a de garantir a condição dos perecíveis: ele fazia isso experimentando um pedaço de cada comida e um gole de cada vinho antes de serem apresentados ao senhor. Colocava sua própria vida em risco, pois se a comida ou o vinho estivessem envenenados por algum inimigo, o sommelier certamente morreria.

Quem é e o que faz um sommelier ?
Embora cada vez mais restaurantes mundo afora contratem sommeliers, a Itália, tem mais sommeliers do que qualquer outro país, inclusive a França – cerca de 8 mil, segundo a Comissão Italiana de Comércio. Nos EUA e no UK, os sommeliers muitas vezes aspiram obter o prestigioso grau de Master Sommelier atribuído pela Court of Master Sommeliers, com sede em Londres. Para obter esse título (que passou a ser concedido nos EUA a partir de 1987), os sommeliers devem passar por uma desafiante prova de degustação que dura três dias e por um exame escrito. No ano 2000, havia 42 Master Sommeliers nos EUA, dos quais dez mulheres.
Na década de 1980 a palavra sommelier começou a ser deturpada e estereotipada. Era quase uma caricatura de um ”conselheiro de vinhos” vestindo smoking, “taste-vin” pendurado ao pescoço e habilmente intimidando os clientes do restaurante a consumirem vinhos caríssimos. Hoje, um sommelier escolhe os vinhos, abastece a adega do restaurante, monitora o inventário de vinhos, realiza sessões de treinamento em vinhos para outros membros da equipe e também trabalha na sala de jantar recomendando os vinhos aos clientes, se assim o desejarem.



Sommelier Alexey Mitrofanov

Antes de seguirmos adiante, já podemos esclarecer, portanto, a diferença entre um sommelier e um “crítico” ou “especialista” de vinhos. Um sommelier tem um certificado em mãos e estudou muito para isso. Um sommelier não pode assim se auto-intitular. Não é o caso dos críticos e especialistas. A estes basta serem enófilos, para se auto-intitularem o que bem entenderem. O caso desta matéria, e que me deixou boquiaberta, foi o fato de perceber que o articulista desconhece o significado da palavra enofilia. Tanto é que logo no 1º parágrafo, ele dispara o seguinte trecho de uma frase: “os testes científicos que a ‘indústria da enofilia’ foi submetida nas últimas décadas”. Indústria da enofilia? De onde ele tirou isso? Do livro da Profª Heloísa Ramos? Vamos ao Aurélio. Enofilia [De en(o)-1 + -filia.] Substantivo feminino. 1. Apreço ao vinho. 2. Tendência a ingestão habitual de vinho. [Antôn.: enofobia.]. O Sr. Articulista esqueceu-se, provavelmente, que o nome do segmento industrial em questão é bem mais simples do que ele pode imaginar, ou seja, indústria de vinhos. Ou será que alguém sai fabricando pelo Vale dos Vinhedos, no RS, “apreço ao vinho” engarrafado? Indústria da enofilia pode ter um outro significado, um tanto pejorativo. Seria toda uma “indústria” que se desenvolveu a partir de o vinho ter-se transformado num modismo urbano a partir dos anos 80, assim como aconteceu com os restaurantes japoneses e seus sushis e sashimis.


O Château Margaux, produtor do vinho de mesmo nome
O texto fala no geral de testes-pegadinhas que deixaram muitos críticos e especialistas constrangidos com seus “micos”. Eu não esperaria outra coisa, críticos e especialistas nada mais são do que pessoas que apreciam o bom vinho, e por isso, estes sim, os verdadeiros enófilos, podem se enganar, pois não têm o paladar treinado para a prova de vinhos, assim como acontece com os provadores de café, por exemplo.


A cave do Château Margaux

O que quero ressaltar aqui é que um sommelier, e mesmo um enófilo verdadeiro, não se deixam levar por rótulos e/ou preços de vinhos. Caso isso aconteça, e sempre aconteceu no mundo inteiro, não é a regra. Só mesmo os sommeliers "sem muitas papas na língua", ousam dizer que determinada safra de um Château Margaux, por exemplo, não foi boa. Notem que essa menção foi apenas um exemplo! A maioria dos sommeliers são, como todos e tudo atualmente, politicamente corretos, e não falam mal de um vinho de procedência secular. O Château Margaux, vinho da região de Bordeaux, é considerado um dos melhores vinhos do mundo, conhecido como ”grand cru premier classé”. Ele é uma assemblage na seguinte proporção das uvas que o formam, aproximadamente: 75% Cabernet Sauvignon, 20% Merlot, 3% Petit Verdot e 2% Cabernet Franc.



Château Margaux, considerado um dos melhores vinhos do mundo

Glossário
Aqui faço um mini-glossário, baseada em informação de Fernando Miranda, que é professor de degustação. Observem abaixo as diversas personalidades envolvidas com o vinho. O intuito é dirimir dúvidas sobre o assunto.
Enólogo - profissional de nível superior das vinícolas, encarregado das diversas e complexas etapas da criação dos vinhos, desde a concepção, passando pela seleção das uvas, elaboração do produto em cantina, até o engarrafamento.
Produtor - é o proprietário do vinhedo que juntamente com sua família e mais um ou dois empregados, colhe suas uvas, vinifica, engarrafa e vende. Muitos proprietários são enólogos ou mandam os filhos estudar enologia.
Negociante - é aquela pessoa que compra o vinho a granel em um produtor e engarrafa com o seu próprio rótulo.
Negociante beneficiador, “negociant eleveur” - é aquele que compra o vinho e coloca-o em barricas de carvalho para “envelhecer”, a fim de melhorar sua qualidade.
Sommelier - profissional de restaurante encarregado dos vinhos, desde a elaboração da carta, compra e manutenção do vinho na adega, aconselhamento do vinho aos clientes e o respectivo serviço à mesa. Algumas boas delicatessens também contratam sommeliers para auxiliar clientes em suas compras
Enófilo - palavra de origem grega que significa "amigo do vinho" (enos = vinho + filos = amigo), que inclui todos as pessoas amantes do vinho, incluindo aí todos os profissionais acima e, obviamente, os consumidores.

Depois de todo esse “quase tratado” sobre Dioniso, que os romanos trataram de surrupiar dos gregos e batizar de Baco, não me venham mais com essa coisa de que sommeliers e enólogos não conseguem identificar um bom vinho. Identificam, sim. E muito bem. O que não se pode é deixar-se influenciar por espertinhos que, para vender, desde livros, passando por mini-cursos, degustações de vinhos com queijos (o que é um ultraje!) chegando a palestras e entrevistas na TV, dizem aquelas famosas frases patéticas que tentam descrer o sabor do vinho que estão provando. Coisas do tipo: ”Esta uva é perfeita, o sabor que fica na boca é amadeirado com notas de frutas vermelhas. É um vinho leve... Leve mas com presença marcante; lá no fundo remete-me às jabuticabeiras da casa da minha avó!!!!” E foi exatamente isso que talvez o articulista tentou dizer, mas acabou não dizendo.


Um comentário:

  1. Eliane, adorei a aula! Esse texto me fez lembrar de uma canção que cantam juntos Zeca Baleiro e Zé Ramalho, chamada Bienal (http://letras.terra.com.br/zeca-baleiro/73692/).

    O vinho, assim como a arte não se explica na sua objetividade. Na sua composição talvez. O melhor vinho que já tomei foi produzido artezanalmente por uma família da cidade de Colombo, da grande Curitiba, e custa apenas 24 reais, rsrsrs.

    E como dizia meu irmão mais velho: gosto não se discute, se lamenta. Eu acho Gisele Bundchen feia, perde de lavada da Renata Fan, por exemplo. Muitos discordam de mim... mas é o que eu acho.

    Esse lance de avaliar vinhos, na minha modesta opinião, é um processo cultural muito mais místico do que útil, com a mesma proposta de quem avalia uma sinfonia ou uma obra do artista plástico. Se vinho for encarado como uma arte pode ter diferentes opiniões e critérios para análise. Mas como é um bem de consumo prefiro simplesmente dizer: esse aqui eu gostei, esse outro não, rsrsrs. E cada um que pense o que quiser sobre ele.

    Grande abraço!
    Adriano

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